A COP30 se aproxima e será, possivelmente, a última grande oportunidade para alinhar as políticas energéticas e climáticas antes de 2030. O evento ocorrerá de 10 a 21 de novembro em Belém do Pará – a “Porta de Entrada da Amazônia” –, reacendendo a esperança após a sequência de conferências no Egito, EAU e Azerbaijão, que foram marcadas por críticas à captura geopolítica dos eventos por regimes dependentes de combustíveis fósseis e restritivas em direitos, refletindo-se em resultados limitados e no crescente ceticismo sobre o modelo.
O Brasil, que será o anfitrião em 2025, se apresenta como um contraponto: um país com uma forte agenda de descarbonização industrial e uma matriz energética altamente renovável, alcançando 88,2% de renovabilidade, segundo o Relatório Síntese do Balanço Energético Nacional 2025.
É essencial distinguir entre barulho e preocupação real, compreendendo o que os mais de 190 países devem apresentar, para exigir um compromisso nacional equivalente e, no âmbito empresarial, antecipar tendências e definir estratégias mais eficazes em tempos de transição.
Embora os temas da COP se repitam (mitigação, adaptação, gênero, energia, financiamento, entre outros), os entregáveis variam a cada edição. Este ano, a maior expectativa recai sobre a apresentação das NDC – compromissos nacionais de redução de emissões e adaptação – que, conforme o Acordo de Paris, devem ser progressivas e mais ambiciosas do que as anteriores, refletindo avanços reais e mensuráveis.
Em Portugal, como Estado-membro da União Europeia (UE), espera-se maior ambição em relação ao compromisso de 2023, que previa uma redução de pelo menos 55% nas emissões líquidas até 2030 e a meta de atingir a neutralidade climática até 2050, alinhando-se ao objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5°C. Mas o cenário energético atual será compatível com esse aumento de ambição? Em que medida a energia contribui para o cumprimento da exigência de uma NDC progressiva?
O setor energético representa simultaneamente o maior emissor e o principal agente de redução de GEE em Portugal, responsável por cerca de 67% das emissões – sobretudo nos transportes e na produção de energia, segundo o Relatório do Estado do Ambiente 2024. Embora o país tenha um dos mixes energéticos mais renováveis da Europa e um forte crescimento na eletricidade verde, essa vantagem não pode nos deixar em uma visão míope.
A transição energética não se limita à produção renovável de eletricidade: transportes e indústria ainda dependem fortemente de combustíveis fósseis e enfrentam barreiras estruturais, tecnológicas e regulatórias. É fundamental integrar aspectos como materiais críticos, circularidade, justiça climática, inovação, armazenamento, eficiência e redes. O desafio é tão complexo quanto sistêmico, e somente a integração dessas dimensões permitirá uma transição realmente ambiciosa e eficaz.
Segundo a International Energy Agency (IEA), a demanda global por energia aumentou 2,2% em 2024, impulsionada por fatores relacionados ao aquecimento global – como o maior uso de refrigeração em temperaturas extremas – pela eletrificação dos transportes e pela expansão dos centros de dados. Contudo, a IEA revisou para baixo, no relatório de outubro de 2025, a previsão de crescimento das renováveis para 2025-2030 em 5%, refletindo mudanças políticas, regulatórias e de mercado.
A McKinsey, em um relatório recente, confirma que as emissões do setor energético continuam acima da trajetória compatível com 1,5°C em todos os cenários analisados, enquanto a UE enfrenta instabilidade regulatória que afeta os compromissos de sustentabilidade corporativa.
Esse quadro evidencia um gap preocupante entre o ritmo necessário e o real avanço da transição energética. A COP28 já havia alertado para a urgência de triplicar a capacidade renovável e duplicar a eficiência energética até 2030 – metas que hoje parecem distantes. A questão que se impõe é o que a COP30 poderá efetivamente entregar e como garantir que os compromissos revisados traduzam a progressividade e a ambição que o momento exige.
Todos esses dados e reflexões sobre tendências globais (e Portugal faz parte do mundo, não esqueçamos!) precisam ser considerados ao projetarmos a transição energética na NDC que será apresentada, bem como em todos os outros compromissos e na agenda do país na COP.
Mais do que anunciar metas, será necessário assegurar a coerência entre a política climática e a política energética. Portugal tem condições de liderar pelo exemplo dentro da UE – mas a compatibilidade entre a NDC e o cenário energético dependerá menos da retórica e mais da definição concreta de metas transparentes e medidas estruturais.
